Livros que deveriam ser publicados no Brasil #1: I have no mouth & I must scream, de Harlan Ellison
Começarei com I have no mouth & I must scream, conto de 1967 do americano Harlan Ellison, que é um dos mais importantes autores da história da ficção científica. Ganhador de inúmeros prêmios e autor de quase 2.000 trabalhos, é um dos fundadores da New Wave na ficção especulativa. Ele é mais conhecido por ser roteirista das séries Babylon 5 e Star Trek.
O computador americano absorveu os outros dois, engoliu o mundo inteiro, matou todo mundo e, cheio de ódio pelos humanos, deixou cinco deles vivos, para torturá-los por toda a eternidade. Eles são rejuvenescidos, mantidos sempre na mesma idade, e curados sempre que se machucam.
A “barriga” de AM é como uma imensa caverna de metal, onde ele é onisciente e cria quaisquer condições climáticas.
Todos os personagens foram afetados de forma a humilhá-los da pior forma possível. O que virou macaco era um bonito e inteligente professor universitário. A mulher havia sido abusada sexualmente antes e tornou-se uma escrava de seus desejos; ela frequentemente faz sexo com os outros (e gosta especialmente do homem-macaco). Gorrister tinha ideais fortes, chegando até a ser objetor de consciência na guerra, mas virou um covarde. O único que está relativamente são é Ted, o protagonista. Mas não por muito tempo.
Enquanto AM estava em sua cabeça, atormentando-o, Ted pensa que o único jeito de eles se salvarem é se matando, já que AM pode deixá-los imortais, porém não indestrutíveis, e também não teria o poder de revivê-los. Nesse momento, AM sai de sua cabeça, com medo.
E temos aí o setting de nossa estória.
“A violência é dolorosa, é cheia de sangue, machuca pessoas, mata pessoas, e eu acho que, quando você mente sobre ela -- quando você a deixa bonita --, você faz as pessoas acreditarem que podem cometê-la com impunidade.”
Essa é uma estória extremamente alegórica, principalmente no que concerne a temas religiosos. AM aparece para os humanos como um arbusto em chamas e ele próprio é uma alegoria do inferno. Ele mesmo não tem boca. E precisa gritar.
O nome AM também vem de I think, therefore I am, de Reneé Descartes. O tema principal do conto é o alerta para os perigos da inteligência artificial (IA), o que é um tema bastante atual. Os algoritmos das IAs dependem dos dados que são injetados neles. Por exemplo, se o banco de dados de uma IA de reconhecimento facial for alimentado com os dados de negros criminosos, essa IA será extremamente racista. A IA não é baseada na realidade, mas só em uma parcela da realidade (os dados que você injeta). No caso de AM, todos os seus dados eram relativos à morte. Como o computador só sabia matar, ele virou aquele “ser” horroroso.
É um conto importante porque, ao lado de uma antologia organizada por Ellison, começou a New Wave do sci-fi, uma revolução. Antes disso, a FC era muito pura, bonitinha. A partir desse movimento, o sci-fi começou a ser mais soft -- no sentido de ser mais liberal nos conceitos científicos -- e a lidar mais com temas políticos, sociológicos e filosóficos. Vimos essa tendência também no cinema.
O conto foi adaptado para um jogo, em 1995, co-escrito pelo autor original, que também empresta a voz à AM. Eu não cheguei a jogar, mas dizem que é bastante perturbador por suas imagens (a de cima é só um gostinho) e também dá mais backstory aos personagens. Vemos, por exemplo, que Nimdok era um médico nazista.
Eu usei esse conto de exemplo, mas quase todo o trabalho do autor Harlan Ellison ainda é inédito no Brasil. E precisa ser publicado. Temos apenas alguns quadrinhos; podem ser encontradas traduções de fãs na internet.
[ATUALIZAÇÃO] Descobri que o conto já foi, sim, publicado no Brasil. Foi na coletânea "Máquinas que Pensam - Obras Primas da Ficção Científica", da editora L&PM. Mas está fora de catálogo, então esse post ainda tem razão de ser.
Eu não tenho boca, e eu preciso gritar:
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