Dicas de Escrita #5: Minha opinião após assistir três MasterClasses sobre escrita
Vendo isso tudo, nossos olhos brilham, e clicamos. Ficamos maravilhados; o site é lindo. Estampamos um sorriso na cara quando vemos rostos conhecidos dando aula... Mas aí vem o susto: o preço. A MasterClass é bastante cara, e ainda por cima é em dólar. Eles têm um sistema bem esperto de cobrança: ou você compra aulas avulsas ou você paga a inscrição anual, tendo acesso a todas as aulas. Uma aula custa U$ 90 e a inscrição anual custa U$180.
Um absurdo!
Mil conto é dinheiro demais para ser debitado de uma só vez, bicho!
A propaganda dessa MasterClass me enchia tanto o saco que acabou sendo a primeira que eu fiz.
Dividida em 19 tópicos, que vão desde a mera introdução, passando por contos, diálogos, descrições, e culminando nas responsabilidades do escritor, a MasterClass de Neil Gaiman tem quase cinco horas. E por um único motivo: ele fala devagar.
Na aula 3, “sources of inspiration”, ele faz uma metáfora muito boa para o cérebro de um artista: a compostagem. Sabe aquele negócio nojento usado para adubar? Então, aquilo é o que sai do cérebro do escritor. Ao longo da vida, vamos tendo experiências, convivendo com pessoas, assistindo filmes… Isso tudo vai entrando em nossa cabeça, vai maturando e se misturando. Um tempo depois (que pode ser dias, meses ou anos), temos a nossa compostagem: uma mistura de tudo que vivemos nos anteriores. Esta é a nossa estória.
Na aula 7, “short story”, Neil diz que contos são para praticar. Eles podem fazer de você um escritor melhor. Você aprende muitas coisas. Pode-se testar estilos, pontos de vista, e até aprendemos a lidar com rejeição. Ele também fala que o personagem já existia antes do conto; aquela estória é só um pequeno recorte da vida dele. É como o clímax de uma estória maior. Tchekhov já falava disso. Para o russo, para escrever um conto, você pega uma estória com início, meio e fim. Aí você corta o início e o fim. O que sobrar é o conto. Cortázar também fala mais ou menos a mesma coisa quando diz que o conto é a escrita do nocaute, e o romance vence por pontos.
Em “descriptions”, Gaiman fala que um substantivo pode ser descrito apenas com um ou dois adjetivos fortes. Por exemplo, ao invés de dizer as medidas de uma porta, dizemos uma “grande e velha porta”. Engraçado, porque acho que ele mesmo não faz isso.
Na aula sobre diálogos, ele diz que não precisamos usar nada além de “ele disse”. E, a julgar pelo o que eu li dele, ele segue isso à risca. É ela disse e ela disse para todo lado, mesmo quando tem só dois personagens. Na minha opinião, isso deixa a leitura muito cansativa.
E é isso. Eu realmente absorvi muito pouco aqui. Quase tudo que ele falou, eu já sabia. O resto, são só histórias da vida dele, exemplos, leituras de seus próprios livros e quadrinhos -- a aula sobre quadrinhos, diga-se de passagem, é uma piada; ruim demais. O melhor da aula foi todo colocado no trailer. E pensar que o próprio é professor universitário...
A Masterclass dela é chamada “A Arte do Conto.” E esse foi o motivo de eu ter arriscado assistir, mesmo não conhecendo a autora.
Pois é. Acho que só fez sucesso na época porque se trata de uma estória de abuso contada da perspectiva da vítima.
Esse sim é um autor que eu gosto. Ele é autor de Outliers:os fora da curva, que eu li no início da facul. Para mim, ele é o melhor escritor de não-ficção da atualidade, ao lado de Nassim Taleb, autor de Antifrágil e de Harari, autor de Sapiens.
A MasterClass dele é tão grande quanto a de Neil Gaiman: quase cinco horas. Ele até que fala rápido, mas passa pouco conteúdo. A maior parte do tempo é ele contando histórias de sua vida.
A primeira dica que ele dá é na aula “tools for engagement of readers”, em que ele fala do “candy”, que é uma parte memorável do texto; o que os leitores vão se lembrar depois, porque não é possível se lembrar da refeição inteira. Ele também fala que devemos controlar a informação, com o propósito de deixar o público adivinhar. Malcolm dá o exemplo de uma psicóloga que fala normal quando profissionalmente, mas muda de tom quando fala do marido.
Na aula de estudo de caso, Gladwell fala sobre The Pitchman, texto dele sobre um cara que vendia utensílios de cozinha. Já que esse homem era uma criatura de seu meio, Gladwell falou de seus pais e de sua infância. O texto começa falando da fase adulta e só depois da infância, que foi bem triste. Quando ele dá essa informação o impacto é grande porque ele deixou mais para frente. Tudo foi “set the stage” para esse momento.
Em “pesquisa”, ele manda você sair do google! Vá para uma biblioteca, pois “bibliotecários são as pessoas mais legais do país!”
As seis últimas aulas antes da conclusão são as únicas dignas de serem assistidas.
Em “títulos”, Gladwell diz que eles devem ter tensão, emoção. Uma dica é ter duas palavras que se contradigam. O título é uma propaganda e deve ser assim ser considerado pelo escritor.
Em “drafts and revisions”, ele fala que se deve escrever enquanto se pesquisa, e que é melhor que já saibamos o final, pois aí faz todo o processo ficar mais fácil. King também falou disso em Sobre a Escrita (mas ele falou que é contra). Se você tiver bloqueio, reescreva alguma coisa ou pule para outra cena. Escritores não são cirurgiões. Nós podemos fazer a mesma cirurgia quantas vezes precisarmos, até estarmos satisfeitos.
“Como ler” foi a melhor aula para mim. Nela, Malcolm diz que o bom leitor é aquele que procura a intenção do escritor. Deve-se, por exemplo, prestar atenção no contexto em que aquela obra foi produzida, o ano de seu lançamento, etc. O leitor que dá uma avaliação negativa para um livro que ele teria escrito de maneira diferente, é um mau leitor. Se o escritor tinha um objetivo e falhou, aquele texto é objetivamente ruim (essa opinião é minha), mas, se escreveu de um jeito que não agradou, não necessariamente é ruim. Parece que essa aula foi feita para mim; eu comecei esse blog falando de livros que odeio. Após assistir a essa aula, passei a enxergar as coisas de um jeito diferente.
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